A mentira está presente e enraizada no nosso cotidiano, pois mentimos tanto e pelas mais diferentes razões, que deixamos de perceber quando o estamos fazendo.
A mentira tem o poder de enganar não só a outra pessoa com quem estamos conversando, mas também a nós mesmos: passamos a acreditar na nossa própria versão da realidade (é aí que a mentira pode passar a controlar a nossa vida). E, apesar de tão comum e de às vezes assumir ares de inocência, a mentira é também perigosa e pode gerar uma série de consequências negativas. Há desde aquelas pessoas com o chamado distúrbio da mentira compulsiva até mesmo aquelas que obstruem o caminho da Justiça através de enganações e omissões apenas para saírem ilesas de uma investigação. Seja qual for a ocasião, a mensagem de Dr. Cal Lightman, da série ”Lie to Me” (trad: minta para mim), é clara: não há como manter uma mentira por muito tempo.
”O único jeito de três pessoas serem capazes de manter um segredo é se duas delas estiverem mortas”.
No seriado, o Dr. Cal Lightman é um especialista em identificar mentirosos, sendo capaz de ler até mesmo os micro detalhes de suas expressões faciais. No entendimento dele, uma mentira não consegue perdurar porque a verdade sempre vem à tona, na medida em que o próprio cérebro do mentiroso evidencia que a pessoa criou uma história alternativa à verdade. Confira abaixo uma cena do primeiro episódio da série:
Em uma matéria realizada pela BBC, três principais perfis de mentirosos foram traçados: o mentiroso exagerado, o mentiroso nervoso e o mentiroso agressivo. Ainda, a matéria comenta sobre métodos diferentes de investigação, que consistem na realização de perguntas aparentemente irrelevantes e detalhistas (a la Tarantino) ou mesmo na leitura da linguagem não-verbal do indivíduo.
Se uma pessoa realiza uma denúncia de assalto à polícia, por exemplo, e apressa-se para relatar o ato do roubo em si, mas se irrita quando o policial questiona sobre os antecedentes do incidente (detalhes aparentemente banais, como o que você almoçou naquela tarde, o que estava ouvindo no carro a caminho do local em que o assalto ocorreu, etc), então é provável que a história não seja tal qual a versão que a testemunha deseja contar.point 361 |
Segundo Joe Kenda, veterano do Departamento de Polícia de Colorado Springs, ao perceber que a testemunha demonstra irritação, atrapalhação ou inquietação em algum ponto da história, é um sinal de que o relato pode ter sido parcialmente inventado.point 209 | 1
Quem não se lembra do caso envolvendo nadadores americanos que denunciaram um assalto à mão armada no Rio de Janeiro, durante as Olimpíadas da Rio 2016? Alcoolizados, os atletas depredaram o banheiro de um posto de gasolina na Barra da Tijuca e inventaram a história do roubo para justificar a confusão causada com o dono do estabelecimento.
Joe Kenda afirma: “Como policial, não confio nem acredito em ninguém”.
Por diversos fatores, o comportamento das pessoas tende a ser previsível, por isso é fácil desestabilizá-las quando relatam algo extraordinário.point 248 |
Para Kenda, a vítima normalmente deseja focar apenas no fato central do ocorrido – na denúncia de um assalto à mão armada, por exemplo -, mas são os detalhes que mais interessam o investigador.point 166 | Concentrada em relatar o fato central da forma mais crível possível, normalmente a vítima subestima o valor dos mínimos detalhes, e esses costumam ser os pontos frágeis das histórias falsas.point 327 |
Esse método foi bastante evidenciado na série policial ”Columbo”, famosa na década de 70.point 88 | 1
No entanto, não basta apenas confrontar o mentiroso com as limitações do seu relato: a análise também deve abranger uma leitura da linguagem não-verbal do indivíduo, ou seja, deve ler o seu comportamento e expressões.point 271 |
Levantar a voz, defender-se sem necessidade, evadir-se, demonstrar sinais de irritação ou contrariedade, dentre outras posturas, podem delatar o mentiroso.point 136 | Esse aspecto é bastante trabalhado no seriado Lie to Me, mencionado no início do artigo, mas também estudado em instâncias mais comuns da vida, como numa mesa de poker, por exemplo.point 287 | 1
Se por um lado a maioria das pessoas não é boa em mentir, há um pequeno grupo que o faz muito bem, sendo capaz de manter o tom de voz uniforme durante toda uma conversam, sem apresentar sinais de culpa, dúvida ou nervosismo. Hábeis em não demostrar emoções humanas, essas pessoas relacionam-se ao perfil sociopata. Geralmente frios e minuciosos, esses indivíduos costumam ser pegos pelas demonstrações de raiva, único sentimento que não parecem conseguir controlar.
Figuras políticas normalmente recebem assistência qualificada para ”maquiarem” suas falhas e projetarem uma imagem diferente em frente às câmeras. Em 1998, o então presidente dos EUA, Bill Clinton, envolveu-se num escândalo sexual com a secretária da Casa Branca, Monica Lewinsky.
Então casado com a advogada e política Hillary Clinton, o presidente negou veementemente o caso sexual, manifestando raiva e repugnância pelo teor da acusação. Kenda explica que esse tipo de reação normalmente busca atingir a empatia do público, expressando um falso sentimento que, embora o mentiroso não sinta, ele sabe que a vítima espera dele.
Além do caso de Clinton, também podemos destacar um mais recente e ocorrido no Brasil: o caso da jovem que assassinou os seus pais por dinheiro, Suzane Von Richthofen. No vídeo abaixo, o especialista Ricardo Ventura analisa detalhadamente o comportamento da jovem em uma recente entrevista ao apresentador de televisão Gugu. Confira a leitura do especialista – é muito interessante!
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